Bem no começo desse ano, em janeiro, antes de toda essa agonia que nos encontramos, de pandemia e quarentena, a banda soteropolitana Vernal lançou o seu mais recente trabalho, Epicteto. Essa ressalva inicial do período desse lançamento se faz presente pelo fato de trazer uma recordação recente, de se botar na praça algo novo e poder circular livremente por aí pelas gigs e se esbarrar com os seus autores em um palco tocando as suas canções.
Digo isso de maneira geral, até. As produções da cena continuaram e continuam em meio a quarentena, mas esse sabor de presenciar as coisas de perto já começa a pesar, de certa maneira, e visitar esse disco da Vernal também é visitar esse período de cerca de dois meses e meio, ou três (quase!), de liberdade sem restrições que ainda gozávamos. Olhando mais para dentro desse momento, o trio estava vivendo uma boa projeção na cena, com boa frequência de shows e aparição em canais de comunicação alternativa, alguns deles em seus passos iniciais.
O ano passado, na verdade, preparou bem o caminho do grupo para esse inicio de 2020. Pela time line de alguma rede social dava para pescar o seu nome em vários cartazes de shows, até que, enfim, consegui ver uma apresentação sua no evento Rock de Azeite #6, em julho de 2019. Posso dizer que foi uma das apresentações mais interessantes da matine, com um pos-hard core entrosado e veloz, que me chamou a atenção por se destacar em meio ao longo lineup daquele dia. Com o senso de atenção aguçado, restava aguardar o que quer que fosse investido pelos três e conferir-los dentro do estúdio. Até que o Epicteto chegou!
O disco começa suave com Limbo. O seu dedilhado inicial indica uma balada, mas na verdade logo se afasta desse caminho e segue um outro, com os instrumentos dando forma à canção de uma maneira bem peculiar e pouco previsível, expondo bem a sonoridade da gravação. Contramão surge mais intensa, com um pouco mais de luz e sombra, dando variedade às emoções da faixa e trazendo um bom refrão com boa performance vocal. Na sequência, Atos de Violência traz um peso sem perder a ternura, conduzindo um texto fincado em uma critica à violência exposta sem mais considerações na mídia, enquanto Brincando de Herói tem uma atmosfera inicialmente mais empolgante, para em seguida ficar mais calma e então mais expressiva. Meus Olhos encerra o disco em seu momento mais pesado, com riffs marcantes e uma cozinha que não vacila, sem perder a característica sonora da sua jornada durante a obra.
Em Epicteto, a Vernal não pisa tanto o pé no acelerador. O que não é algo ruim! A estética do disco dá contornos grandiosos às composições do trio e garante a elas uma uniformidade na qual se propõe em expressar. Os sons cristalinos dos instrumentos demonstram o cuidado na qualidade da produção do disco, favorecendo até os recorrentes curtíssimos silêncios dentro de determinadas faixas, pontuando o clima das canções. As letras, que tratam sobre o cotidiano, relacionamentos e questões sociais, também se destacam em meio às texturas, distorções e viradas de bateria, ajudando a dar forma ao contorno épico do disco. A belíssima capa, com a imagem do cosmo, já entrega bem isso.
Comentários
Som bem sintetizado, que se destaca em meio ao cenário.