O
rock acima de tudo é diversão. Você pode esbravejar para os quatro (ou mais)
cantos do mundo o quanto está puto e insatisfeito com o sistema, o quanto está
triste e com o coração partido por ter sido deixado de lado e até mesmo o
quanto foi boa ou traumatizante a sua experiência de abdução por alienígenas
sedentos em estudar o seu DNA, mas tudo de certa forma ganha graça para quem
monta seus acordes sobre os seus temas. De certa maneira é um jeito estranho de
se divertir, mas esse elemento está lá e esse tipo de música garante a quem a
escuta e a faz uma sensação boa no final das contas.
É
bem assim com a banda soteropolitana Pancreas, que lançou recentemente o seu
terceiro álbum de sua carreira, Cru e Vivo. O disco é um apanhado ao vivo de
boa parte de suas canções disponibilizadas anteriormente em seus dois discos,
com mais duas versões de outras bandas feitas por eles. O cd foi gravado no
projeto Casarão/Homepocket Clipoems, onde alguns grupos da cena local gravaram
sessões ao vivo de seus shows em um estúdio, lançando-os aos poucos na web. E
esse Cru e Vivo é a primeira investida em disco físico dessas bandas e traz
para o ouvinte como são de certa forma as apresentações delas ao vivo pelos
palcos da Bahia. É uma boa oportunidade para conhecer tais conjuntos e a
Pancreas dá um bom start nessa empreitada.
Sendo
uma das mais ativas no cenário atual, o quarteto tem a seu favor o bom humor e
um rock fincado no punk oitentista, no hard rock, com letras que fala sobre
cotidiano e de situações no mínimo interessantes que certamente alguém vai se
identificar de cara com os primeiros versos cantados pelo Shinna Voxzelicks. A
obra abre com A Morte te dá as Mãos, um aviso para aqueles que gostam de viver
perigosamente depois de tomar umas biritas e sair de carro depois de uma balada
na madrugada. Em seguida vem Na Esquina, um punk rock veloz com alguns momentos
arrastados de bons riffs de guitarra e cozinha entrosada. Em Rio Acima a
velocidade continua com a voz rasgada de Shinna e um segundo de jazz em sua
metade para voltar ao seu ritmo normal até o seu término.
A Lenda de Leopoldo
tem uma letra interessante, que fala de um rapaz que era um verdadeiro leite
com pera na sua adolescência, resolvendo os problemas de física para as meninas
e não ficava com ninguém, mas que sofreu uma transformação que mudou a sua
condição radicalmente e se fez um dos caras mais bem-sucedidos nos aspectos em
que era um desastre. Mas quem será Leopoldo? Fica a o mistério. Isso, diga-se
de passagem, com um som empolgante do início ao fim. Priscila é a balada da
banda, com versos românticos que detalham o quanto o letrista deseja tanto o
seu amor à Priscila e o quanto ele quer faze-la sentir prazer explorando todos
os cantos do seu corpo. Simplesmente singela e verdadeira! Em Daniele continua
com uma declaração de amor de uma maneira mais animada e com intenções
escancaradas de leva-la para cama.
Em O
Corno, a banda começa com uma versão arrocha bem-humorada da canção, dedicando
ela a um amigo para depois acertar no ritmo certo e citar algumas condições
pelas quais alguns sofredores devem passar quando se encontram em tais
condições. Depois dela surgem na sequencia duas boas versões de canções de
outras bandas, a primeira é a ótima Remédio da baiana Jato Invisível que tem
uma letra bem inteligente e com momentos que lembram Dead Kennedys e a segunda
é Help!, dos Beatles, em uma versão mais rápida e punkerosa.
O final do disco
tem uma sequência de duas das melhores músicas da banda e que são responsáveis
em animar o lugar onde estão. Ela Gosta de Forró, trilha com passagens épicas e
bom solo de guitarra, é uma maneira boa de expressar como tanto tipo de música
é insignificante e que mesmo sendo uma moça interessante, ela pode ter um gosto
musical duvidoso que pode comprometer a relação. Muitos não estão a salvos de
algumas pragas! E Eu Quero Você Pra Mim encerra o disco com chave de ouro, sendo
ela uma das mais animadas do grupo, com uma pegada de ska e bem apropriada para
a pista de dança e declarações de desejo para várias coisas, inclusive desejando
alguém para si mesmo.
A
sonoridade do álbum é de excelente qualidade e de boa captação, uma vez que foi
feita ao vivo, algo muito difícil de se executar. Ela transmite bem a atmosfera
da banda em seus shows. Volto a afirmar que esta é uma maneira de se ter uma
noção de como é a banda em cima de um palco, que anima e diverte com seu rock
que, ao mesmo tempo é levado a sério, engajado com as causas da cena e
bem-humorado na medida certa que deve ser. Se vale a pena escuta-los? É lógico
que sim, se você ainda não conhece o Pancreas você corre o sério risco de
acordar no outro dia com uma ressaca chata e sem uma boa história para contar.
Conheça
o som da Pencreas: https://soundcloud.com/pancreasoficial
*Matéria originalmente publicada em 15/06/2016.