Início
de semana, tempo frio em Salvador. Combinações nada amigáveis para um cidadão
sair de casa, a menos que ele tenha um bom motivo e um ótimo propósito para
fazer isso. E de fato motivo sobrava para conferir mais uma edição do
"Quanto Vale o Show?”, evento organizado pelo Rogério Big Bross e que
acontece religiosamente em quase todas as terças feiras do ano. Nesse em
questão, foi dedicado ao tema Noite Home Pocket/Clipoems Rock, no qual duas
bandas que participaram da iniciativa de mesmo nome (criada por Arthur Caria,
Candido Martinez e Udo) se apresentaram no melhor de sua forma. Pancreas e
Declinium, juntas, criaram uma expectativa muito grande para a noite e muita
gente foi conferir o que aconteceu no palco do Irish Pub.
Depois
de uma viajem vagarosa de ônibus direto da cidade baixa, chegando no Rio
Vermelho uma boa constatação: a calçada do lado dos bares finalmente foi
finalizada e aquele verdadeiro lamaçal no qual você poderia optar por passar
por cima e se sujar todo, ou cair em um buraco, ou ir para o meio da pista se
arriscar a ser passado por cima por um carro finalmente não existe mais. O
clima estava tranquilo e algumas pessoas já se encontravam no recinto. Umas
boas e velhas personas bem conhecidas e outras recém-chegadas já conversavam e
esperavam atentos ao início das apresentações. Papos sobre a cena, troca de
figurinhas e histórias de um passado recente do cenário aqueceram a noite antes
do início das atividades. Mais e mais pessoas estavam chegando ao lugar até que
um número empolgado e bastante considerável tomou o espaço a tempo de pegar a
primeira banda a se apresentar.
E
quem deu o ponta pé inicial no som foi a Pancreas. Com um som redondo e bem
ensaiado, o quarteto se encontra em uma boa forma musical, tocado com
frequência pela cidade e se mantendo firme na sua labuta roqueira incansável. Nem
mesmo a sedutora possibilidade de substituir o vocalista do Malta abalou o
vocalista Shinna Voxzelicks, que decidiu em ser fiel a sua investida musical
com seu grupo. Ponto para ele, pois a performance foi sensacional e, como
sempre, divertida! O seu show foi cheio de surpresas e de convidados especiais,
a começar pelas músicas novas. Verdades Insanas, canção que estará no próximo
disco dos rapazes, se mostrou uma música realmente mais pesada do que as do seu
repertório habitual.
A apresentação teve muita participação especial também,
como a do vocalista d’Os Tios, Anderson Dias, e do Emanuel Oliveira, da Jack
Doido. A performance foi avançando e músicas como Ela Gosta de Forró e Eu Quero
Você Pra Mim se destacaram no setlist animado e cheio de punch e botou muitas
gente para dançar. Mas teve uma em especial que me chamou a atenção. A versão
de Remédio, da Jato Invisível, que eles sempre fazem nos shows estava
ligeiramente mudada. A música que tinha até então uma pegada mais rápida,
passou a ter uma veia mais pesada e soou muito bem nos ouvidos de quem estava
mais atento ao som dos caras. Mais um ponto para eles.
Depois
da Pancreas, subiu ao palco uma das bandas das quais eu já estava devendo uma
presença em seus shows. A Declinium é uma banda de carisma enorme, com uma
devoção igualmente grande de seus seguidores e admiradores, e estavam
celebrando nesta noite um documentário sobre o próprio grupo. Já ouço falar
deles há bastante tempo, um pouco mais de uma década, e agora tive a grande
oportunidade de vê-los de perto e sentir o quanto o quarteto entra em suas
canções e passa tanta emoção para quem os assiste, fazendo um espetáculo bonito
de música e sinceridade. A competência deles como músicos é inquestionável e o
repertório é verdadeiramente arrebatador, sendo tocado com muita fidelidade e
com uma leve pitada shoegaze característico da banda. As pessoas que ainda
estavam mantendo o lugar cheio cantavam junto as canções extravasando
sentimentos guardados para serem soltos naquele exato momento, em cada verso e
refrão, esperando que as letras virassem mantras a serem repetidos por um bom
tempo.
Também teve surpresas na apresentação dos rapazes, o artista Ivan
Antônio recitou um poema em meio ao público e mais outro em cima do palco antes
que a canção Marte fosse tocada e cantada com empolgação pela banda e plateia.
Em A Espera, Oreah chamou a todos que quisessem subir ao palco para cantar esta
junto com eles. Foi tanta gente no tablado que ficou difícil achar microfone
para quem quis, até porque tem sempre um mais empolgado que canta aos pulmões.
Aqui não foi diferente e um dos que estavam no meio havia sido atingido em
cheio no seu âmago pela música e foi difícil dele passar o microfone para outro
alguém, mas foi divertido de se ver. Além das músicas do EP Marte, Fênix e
Calor foram pontos altos na apresentação. Foi uma ótima experiência.
Quem
não foi não deixe de ir da próxima vez. Seja na apresentação deles, ou de
outras bandas. Os shows não foram longos, mas duraram o suficiente para mostrar
o quanto a cena vai bem e o quanto as bandas agradecem de verdade a sua
presença nos eventos. É sempre bom prestigiar o cenário local e as suas canções
autorais, degustar isso e trocar ideias com quem faz a cena é de uma grande
satisfação. Palco desmontado, pessoas indo embora, ainda sobrou tempo para
conversar sobre a importância da música e da imagem com amigos de velha data.
Querendo, ou não, tudo está ligado e devemos estar atentos.
*Matéria originalmente publicada em 22/06/2016.