Foto: Rafael Passos.
Durante
a terceira edição do Festial Radioca, batemos um papo descontraído com o simpaticíssimo
quinteto Far From Alaska (RN). Nele, a banda falou sobre o seu novo disco, Unlikely,
sobre como foi trabalhar com a produtora Sylvia Massy, sobre a cena de Natal,
sua carreira internacional, sobre quantas vezes teve que responder do porque de
cantar em inglês e um pouco mais! Se ajeite onde estiver, dê um play no
Unlikely e aproveite a conversa.
Soterorockpolitano
- Gostei muito do Unlikely, o achei muito bacana e gostaria começar o papo por
ele. Ele é um disco mais descontraído, mais solto, mais harmonioso em relação
ao modeHuman. Inclusive, eu vi vocês falando que ficaram um pouco menos presos
em relação aquela coisa do riff. Eu gostaria de saber como foi o processo de
criação do Unlikely, quais foram as influencias que vocês tiveram para poder
criar as canções desse disco?
Rafael
Brasil: Eu acho que esse disco ele veio com a missão de mudar
um pouquinho como as pessoas viam a gente. Às vezes a gente via nos lugares
“ah, a banda de stoner rock de Natal” e as fotos da gente todas sérias, e não é
tanto assim. E aí, ele veio com essa missão de exaltar mais o que a gente
viveu, sei lá, em cinco anos, cada um viu o que gosta mais de fazer, o que
gosta mais de ouvir e aí foi natural esse lance. A gente viu que não era tão
sisudo assim quanto o que a galera botou lá para a gente. Aí ele veio mais
colorido, ele veio propositalmente assim. A gente quis fazer músicas mais
legais de cantar, se preocupou muito com melodia, mudar mais a harmonia, né?
Não ser aquele riff encorpado o tempo inteiro. Adoramos o modeHuman, mais aí o
Unlikely veio com essa outra característica.
Cris
Botarelli: Esse outro humor!
SRP
- Achei vocês bem humorados nessa investida, realmente. Inclusive, lá no Kickante
eu vi que tinha uma solicitação para quem quisesse contribuir com R$1.000.000
para vocês não gravarem o disco...
Cris Botarelli:
Aaah (risos)
Lauro Kirsch: Teve uma hora que kickaram, tá ligado?
Pensei: “Caralho, velho, a gente deveria ter pedido mais, um milhão é pouco!”
(risos)
SRP
- Ainda em relação ao disco, vocês produziram ele com a Sylvia Massy, que tem
no currículo trabalhos com o Tool, Jhonny Cash, Prince, Red Hot Chilli Peppers,
mas o que achei mais interessante é que
ela tem uma metodologia bem peculiar de gravar disco, de tirar som, de criar
sons dentro do estúdio. Eu quero saber como foi a experiência de ter gravado
com ela, eu sei que vocês fizeram alguns experimentos, falem um pouco sobre
isso!
Cris
Botarelli: Foi massa, esse lance todo a gente estava procurando
alguém e tal, e a gente quando encontrou ela, que deu macth no Tinder com ela,
e aí foi ver os seus vídeos da internet, a gente ficou muito apaixonado. Porque
ela curte muito experimentação, mesmo, na hora de gravar e a gente curte muito
essas coisas, essas doideiras! Era exatamente o que a gente estava procurando e
aí rolou. Era tudo muito diferente, assim: o jeito de gravar, não tinha aquário
de gravação, era todo mundo gravando ali no sofá, ela fez uns experimentos com
synth, passou o synth passando por uma salsicha, passando por um picles,
furadeira, começou a botar um bocado de coisa. E era massa porque era uma vibe
assim de tipo, vamos tentar, vamos experimentar, vamos fazer coisas e se não
ficar bom, não usa, se ficar bom, usa.
Lauro Kirsch: Ela não tinha tempo ruim, hora nenhuma! O que você
pensava em fazer, ou, brincando, você falava uma coisa, ela: “Vamos!”. Ou ela
mesma vinha com a ideia doida e a gente aceitava: “Vamos fazer!”.
SRP
- Ela fala que “mesmo que a experiência não dê certo, vai ficar para sempre na
memória e o artista nunca vai esquecer”, achei isso muito bacana. Vi até um
vídeo que ela fez com a captação da bateria...
Emmily Barreto: O Dick Mic!
SRP
- O Dick Mic, que achei super bacana e a achei bem humorada, também acreditei
que isso tenha contribuído com a atmosfera do disco...
Rafael
Brasil: Ela nunca chegava no estúdio pra baixo, ela nunca falava
que o tempo estava ruim. Era sempre “ahh, vamo nessa!”. Aí ela entrou na onda
de a gente, de que cada um é um bicho, né? Aí a gente perguntou pra ela qual
bicho ela era. Ela pensou, chegou no outro dia e falou que ela era um corvo! E
aí ela já chegava “aaaahhhh”, gritando (risos), era massa, era sempre pra cima!
Lauro Kirsch: E às vezes a gente estava maio cansado, assim, de fazer
os takes, sabe, “não acordamos ainda”, estávamos naquela assim, ela vinha e
“vai, animação, aaaahhhh!!”, ficava gritando e trazia todo mundo para dentro do
rolê!
SRP
- A vibe era boa, então!?!?
Rafael
Brasil: Total!!!
Edu Filgueira: Teve até um dia que ela estava doentaça, e mesmo assim,
ela estava “morrendo”, mas estava pra cima, tá ligado? Muito bom!
SRP
- Emmily, os microfones que ela tem lá você pôde usar o tanto quanto você quis?
Emmily
Barreto: Cara, tinha milhares. Quando a gente chegou lá, o Ivan,
o engenheiro assistente dela – na primeira semana ela não estava lá, então a
gente ficou um pouquinho sem ela – ele levou a gente pra conhecer tudo e tal, e
velho, tinha uma sala só de microfone, como tinha de tudo também, de amp. De
tudo! Mas a quantidade de microfone era surreal, se eu fosse escolher era
impossível. Então, graças a Deus, ela escolheu por mim e ela escolheu um
microfone lá de ouro, que era bizarro. Só ele é, tipo, uns 100 mil dólares.
Cris
Botarelli: Era tipo, 30 mil dólares.
Emmily
Barreto: Não, era mais, era mais! Era muito caro! Era de ouro!
Você escutava, se você estivesse usando um fone, você escutava coisa da rua
melhor do que se você estivesse sem o fone, tá ligado? Bizarro, bizarro! Usei
esse mic que eu esqueci o nome, mas eu tenho foto dele.
Lauro Kirsch: Soyous!
Emmily
Barreto: É esse aí!
SRP
- Mudando um pouquinho de assunto, mas ainda com um pé lá fora, quero falar um
pouco sobre carreira internacional. Vocês estão dando os seus primeiros passos
em relação a isso, vocês sentem alguma pressão desse aspecto sobre os ombros de
vocês, como vocês têm lidado com isso por ser considerada uma banda promissora?
Rafael
Brasil: Acho que a palavra que a gente sente não é pressão, não,
é vontade mesmo!
Cris
Botarelli: É vontade de ir logo! (risos)
Lauro Kirsch: A pressão é mais interna, entre a gente de querer fazer
a coisa acontecer do que do público, que já conhece a gente, esperar isso da
gente. Pô, se a gente for, o público vai achar bacana, mas pra gente é muito
mais pressão, de a gente querer fazer a coisa acontecer lá fora. Porque sentir
o gostinho indo para o South by Southwest, indo para o Download Festival, tipo,
é muito massa! A vibe, a receptividade da galera foi bem tranquila. Antes a gente
ficava apreensivo, tipo, “como é que eles vão receber a gente?”, uma banda
brasileira fazendo rock e isso ser “esquisito”, mas a galera foi muito amor e
até hoje mandam mensagem para a gente.
Emmily
Barreto: É, acho que no momento é mais planejamento, a gente tá
com a cabeça nisso mesmo. O nosso objetivo no momento é esse, a gente quer
botar o pé lá fora mais vezes. No começo do ano que vem a gente quer começar já
com turnê lá fora e vamos ver o que rola! A gente tá ansioso!
SRP
- Sobre a cena de Natal, Natal tem uns dez anos que vem se destacando no
cenário brasileiro, apresentando boas bandas com projeção nacional
significativa, um festival expressivo. Para vocês, o que faz da cena de Natal
ser tão destacada e bem sucedida?
Lauro Kirsch: A água!!! (risos)
Rafael
Brasil: Esse lance de ter um festival, de ter uma pessoa
trampando para isso, ter um bar, ter um lugar para as bandas tocarem, isso tudo
acaba movimentando a cena inteira e a gente é fruto disso, inclusive. A gente
cresceu lá tocando em outras bandas e isso é muito importante. Todo lugar que a
gente vai, todo lugar que tem festival a gente fala o quanto isso é importante
para cidade, para movimentar a parada e fazer acontecer. Tanto que eu senti uma
vibe dessa também em Goiânia, por exemplo, que tem o Bananada, que tem a galera
lá que trampa nisso. Então, acho que esse é o diferencial da cidade, que faz
Natal ser especial por ter esse circuito para as bandas tocarem lá no ano todo
e ter os festivais MADA e DoSol.
Lauro Kirsch: E o público corresponde também!
Emmily
Barreto: É, a galera pira! Tipo, a banda favorita da galera é a banda
de lá de Natal e se tem show eles lotam o show, não tem isso de tem que ter
banda de fora para ir.
Cris
Botarelli: Foi um processo isso lá, né? Porque as coisas do DoSol
tem dez anos agora e aí foi um processo da galera se acostumar a consumir as
coisas de lá mesmo, não ter vergoinha, né? Que às vezes a galera tem esse velho
complexo de vira-lata que a galera fica com vergonha de gostar. Em Natal, não, a
galera curte mesmo, sabe cantar, chega no show, se tiver fã compra o merchan ,
tipo, vai no show e paga o ingresso e tudo o mais, é massa! É acima da média de
público também! A galera é bem massa!
SRP
- E das demais cenas, o que vocês têm observado de bandas e de artistas, o que
tem chamado a atenção de vocês no território nacional?
Rafael Brasil: A gente está vivendo um momento muito, muito, muito foda
da música no Brasil. Em toda viagem que a gente vai, para todo canto, a gente
encontra uma banda e fala “caralho, isso aqui era para o Brasil inteiro
conhecer, muito foda”. E a gente pode citar algumas bandas que a gente está em
contato direto lá em São Paulo, que a gente já virou amigo, como Francisco El
Hombre, Scalene, Supercombo, Ego Kill Talent, a lista é gigantesca, não dá nem
para falar todo mundo. Todas bandas fodas com competência para assumir esse
mainstream do Brasil!
Lauro Kirsch: Foi um momento meio que único, porque todo mundo
resolveu sair das cidades que se originaram para ir para São Paulo e tipo, todo
mundo começou a se encontrar em São Paulo pelo polo de logística, de ser mais
fácil para as bandas circularem lá, então muitos artistas como Selvagens a Procura
de Lei, lá do Ceará, eles se mudaram para São Paulo também, o Plutão já foi
Planeta se mudou para São Paulo e fica nessa de ida e volta. E acaba que todo
mundo se encontra nos shows dos amigos por lá, trocando informações, trocando
figurinha, o que tem que fazer, o que não deve fazer e como fazer!
Rafael
Brasil: A gente está doido para que todo mundo estoure, porque o
Brasil precisa conhecer essas bandas, de verdade. Fica meio que só na internet,
a gente vive nesse mundo e vê que tem um público gigantesco de uma galera que
consome, é só as grandes mídias também chegarem junto! Mais, né? Acho que já
estão dando um pequeno espaço, mas tem que ir mais ainda, porque o Brasil
merece conhecer essas bandas boas que estão sendo produzidas aqui.
SRP
- A pergunta agora é uma pergunta sobre uma pergunta: Vocês já contabilizaram
quantas vezes já tiveram que responder do “porque de cânter em inglês”?
Todos:
Aaaahhh!!! (risos)
Emmily
Barreto: Primeiramente, a gente está muito feliz que você não fez
essa pergunta. E foi a melhor pergunta sobre essa pergunta! (risos)
Cris
Botarelli: Teve várias fases, já. No começo, a gente não tinha uma
resposta e a gente inventava. Aí cada vez inventava um negócio. Depois a gente
formulou uma resposta, depois a gente começou a ficar com preguiça de dar a
resposta e respondia qualquer coisa tipo, “porque sim!”. E aí agora é um misto,
hoje em dia quando perguntam é um misto, assim de “a gente fala, mas não fala”,
é que não tem mais o que falar!
Edu Filgueira: Tem a versão curta, a versão média e a versão longa,
depende do bom humor do dia.
Emmily
Barreto: Mas, é chato!
Rafael
Brasil: Acho que essa pergunta se mistura um pouco com o lance
lá de Natal, tipo, a gente tá lá em cima, na esquina, ali, saca? As bandas lá,
elas tocam o que gosta! Claro que lá dentro pode ter o lance de “pô, eu queria
que as pessoas todas conhecessem a minha banda”, mas não, eles fazem do jeito
que gosta. A galera de lá de Natal consome independente de ser em inglês ou ser
em português, então é uma parada real mesmo! E se der certo, se chega em outros
lugares, que irado! Mas o pensamento inicial não é de tipo “vamos cantar em
português para fazer sucesso” ou “vamos cantar em inglês para dominar o mundo e
conquistar noventa e quatro territórios!”.
Lauro Kirsch: Por ser o que a gente gosta e ser muito o que a gente
escuta, também. Tipo, influencia de rock! O rock não é brasileiro, o rock é
americano, o rock é britânico e a gente escuta isso. É tudo em inglês e é
natural fazer aquilo o que você escuta. Soa natural!
SRP
- Questionei também porque normalmente essas perguntas “do porque cantar em
inglês” vêm sempre com uma crítica nas entrelinhas sobre isso. Tipo, “Vocês são
brasileiros, nordestinos, de Natal e cantam em inglês? Como assim?”.
Edu Filgueira: Uma coisa não invalida a outra, né? A gente não está
querendo que todas as bandas passem a cantar em inglês, sempre vai ter espaço
para todo mundo! Aí tipo, muita gente que critica isso nem para pra pensar e
consome, sei lá, o Scorpions, que é uma banda gigantesca, mas é da Alemanha, só
que canta em inglês.
Lauro Kirsch: Nossa, você foi longe, heim?
Edu Filgueira: Não, saca, tipo, a galera não para pra pensar nisso, né?
Rafael
Brasil: E a gente é geração da internet, é da geração que
escolhe o que quer ouvir e que escutou banda em inglês mesmo. Acho que antes
era mais difícil, alguém tinha que vir de fora com o disco para te apresentar e
você conhecer aquela banda, né? Hoje em dia não, cara. Hoje em dia todo mundo
vai, sei lá, no Spotify ou no Youtube e escuta o que quer e tal. E a maioria
das pessoas consomem coisas em inglês, é um preconceito besta e que seria legal
se mudassem!
Cris
Botarelli: Eu fiquei sabendo que rolou uma época, nos anos sessenta
para os setenta, uma passeata contra a guitarra elétrica. Uma lance, tipo, “não
vamos americanizar a nossa música”. Naquele momento poderia fazer algum
sentido, se havia algum movimento rolando, só que eu acho que ficou esse ranço.
Assim, porque quando a pessoa pergunta “porque vocês cantam em inglês se vocês
são do Brasil?”, aí você fala “mas porque não, diga aí?”, a pessoa também não
tem resposta, uma coisa que a pessoa reproduz às vezes sem nem pensar sobre, tá
ligado? Vai ver que é uma herança aí, ó!
SRP
- Para encerrar, vocês fizeram uma pequena maratona pelas cidades baianas,
passaram por Vitória da Conquista e pela segunda vez em Feira de Santana e
agora, finalmente, vocês estão em Salvador, depois de um bom tempo, já
estávamos esperando por vocês há uma cara. O que vocês esperam de Salvador e o
que Salvador pode esperar da Far From Alaska daqui a pouco?
Cris
Botarelli: Rapaz, o que a gente escuta da galera daqui de Salvador
é que a galera é roqueira doidona. Então, a gente está esperando o apocalipse,
está esperando a galera quebrar tudo, porque a gente vai tentar quebrar tudo no
palco também. Então, a gente está com a expectativa bem alta e o que a gente só
escuta é bons comentários da galera daqui.
Rafael
Brasil: E como é a nossa primeira vez aqui a gente vai tocar
muita música do disco novo, mas vamos tocar umas três ou quatro do disco velho.
É a primeira vez, então tem gente que gostaria de ver, né? Que a gente não teve
a oportunidade, a gente não veio aqui antes. Vamos tocar umas velhas, tocar
umas novas. Vamos quebrar tudo! A Bahia tem um lance que o Tiago, que é o
primeiro cara que acho que acreditou na gente na internet, né?
Emmily
Barreto: Ah, sim, sim! Do fã-clube da gente! Ele está aí!
Rafael
Brasil: Ele é daqui da Bahia, o presidente do nosso fã-clube,
ele vai vir hoje, vai ser massa!
Lauro Kirsch: O fã-clube oficial baiano!