Pular para o conteúdo principal

Escrever ou não escrever, eis a questão.*


            Acho que sim. Mesmo sendo sobre o próprio evento e mesmo sendo sobre a própria banda, vale o desafio. Não é uma das tarefas mais fáceis escrever sobre a própria festa e sobre o grupo do qual faz parte, mas isso mais cedo ou mais tarde iria acontecer e não há outra alternativa senão trazer para você, caro(a) leitor(a), o que aconteceu no primeiro Soterorock Sessions ocorrido nessa última sexta feira, no Taverna Music Bar.

            Essa foi a primeira investida do portal em eventos depois de três anos, trazendo um novo nome, propondo um novo formato em relação ao seu antecessor e tendo a intenção de, periodicamente, repetir mais edições, dando ainda mais movimento a cena local. A ideia inicial é sempre formar um line up temático, com grupos que se aproximem em propostas musicais ou extra musicais e, para esse momento, foram escaladas bandas que se originaram na cidade baixa e que possuíam uma relação musical que atravessou os anos. Foram elas a Exo Esqueleto, a Game Over Riverside e a Búfalos Vermelhos e a Orquestra de Elefantes. Nessa ocasião o fator "relação musical" falou muito mais alto, deixando a festa com uma atmosfera mais especial e, com isso, proporcionando ótimas apresentações dos conjuntos para o público que foi prestigia-las.

            A noite começou com um acentuado atraso por conta da espera pela chegada do operador de som do espaço e com as pessoas chegando devagar, e escutando a seleção de música requintada do DJ Sputter. A casa não ficou cheia, porém, deu muito mais pagantes do que a organização da festa aguardava. O evento foi marcado por reuniões, reativação e firmação de bandas no cenário local e quem foi, assistiu a performances viscerais acima da média e que lavaram a alma de muita gente presente. Quem abriu os trabalhos foi a Exo Esqueleto, que estava ha quatro meses sem se apresentar e que prepara um novo EP para ser lançado no ano que vem. Ainda não havia assistido a uma apresentação do conjunto e essa primeira experiência deixou ótimas impressões. Eu guardava uma curiosidade em vê-la de perto e de como a sua proposta musical funcionava ao vivo e ela entregou um show redondo e repleto de toda a sua criatividade. Com sonoridade pesada, a Exo Esqueleto desfilou bem elementos de stoner rock, blues e interessantes elementos regionais baianos, isso sem soar datado, garantindo globalidade para a sua música. Além disso, o visual estilizado dos integrantes foi bem conectado com o seu som, fortalecendo a sua identidade sonora. Sadismo e Visceral foram ótimos momentos trazendo peso e baianidade, respectivamente, Randômico deu ares de psicodelismo para o lugar e ainda teve uma versão "exo" para Fui Fiel, do Pablo do Arrocha (ele mesmo). Foi gigante!

            Depois foi a vez a Game Over Riverside subir ao palco e acabar com um jejum de oito anos sem tocar. Uma das bandas mais presentes na cena na década passada, a G.O.R. resolveu voltar a ativa trazendo o seu guitar band psicodélico, punk, indie e stoner, e trouxe também de volta as suas três guitarras sempre prontas para acabar com o sossêgo de uma noite qualquer. Com praticamente a mesma formação original (eram seis, agora são cinco) e pontuada por um certo nervosismo no início do show, a banda tocou um repertório completamente autoral e de velhas canções, executadas com vontade, porém de uma forma um pouco mais contida que o normal por conta do limite do espaço. Empolgação não faltou no primeiro bloco que foi iniciado com a explosiva Deep Waters, um punk-psicodélico noventista que foi seguido por mais duas outras sem perder o fôlego, passando por um segundo bloco mais stoner em God in a Talk Show e mais tranquilo em seu fim para segurar um pouco os ânimos como na bossa-brit-ambient-psicodélica Why We Don't Kill Our Pets?. O terceiro e último bloco encerrou a apresentação com a punk-indie Little Marchioness fazendo par com I Can't Hardly Wait (Caroline), um pesado manifesto juvenil que não envelheceu com o tempo. Um bom retorno é sempre bem vindo!

            Encerrando a noite, a Búfalos Vermelhos e a Orquestra de Elefantes tocou o seu já conhecido repertório competente e se firmando cada vez mais na cena como uma das melhores bandas da cidade. O duo de atiradores de elite da cidade baixa, cada vez mais priorizando a melhora da sua sonoridade ao vivo, fez a sua apresentação com material totalmente próprio, inclusive a bateria, ganhando com isso mais peso e mais volume de som. Se antes a sua música já soava volumosa, nesta ocasião tudo foi potencializado, ganhando mais brilho e mais força de impacto nos ouvidos de quem estava presente. Foi o rock de chão pisado mais cristalizado. A BVEAODE também trouxe muita vontade em cima do palco. Olhos Virados, Psicologia de Sofá e temas instrumentais ganharam novas percepções de quem já conhecia o som e, como sempre, garantiu mais gente para o seu cada vez maior exercito. Mulher Kriptonita foi mais um ótimo momento da apresentação, assim como a versão "búfalo" de Dos Margaritas, que teve que ser reiniciada por conta de um problema técnico na aparelhagem de som, mas que não foi comprometida.


            Ao fim, essa primeira edição do Soterorock Sessions foi mais uma celebração da boa fase que o rock local vem vivendo atualmente, com bandas fazendo ótimas apresentações e com o público se divertindo junto. Fica aqui também o agradecimento do Portal Soterorock para aqueles que nos apoiaram e que compareceram na festa, e para os grupos que tocaram, deixando a noite mais especial e produzindo gás para que isso aconteça mais vezes. Esperamos vocês nas próximas edições.


*Matéria originalmente publicada em 27/09/2015.

Popular Posts

O Pulsar Rebelde do Rock Baiano nunca tem fim!

O rock baiano, desde suas origens, sempre foi um terreno fértil para a inovação e a fusão de estilos. Se olharmos os textos de Léo Cima aqui do blog "Soterorockpolitano", você vai ver que o cenário atual do rock na Bahia continua a se reinventar, mantendo viva a chama de suas raízes enquanto abraça novas influências. Nos anos 70 e 80, o rock baiano emergiu com uma identidade própria, mesclando ritmos regionais como o samba e o axé com as guitarras distorcidas e a energia do rock. Bandas como Camisa de Vênus e artistas como Raul Seixas marcaram época, criando um legado que até hoje inspira novas gerações. Atualmente, o cenário do rock na Bahia é caracterizado por uma diversidade impressionante. Bandas como MAEV (Meus amigos Estão Velho), BVOE (Búfalos Vermelhos e Orquestra de Elefantes), Entre Quatro Paredes, Demo Tape, URSAL, LUGUBRA, Declinium, Venice e muitos outros nomes trazem novas sonoridades, combinando letras poéticas e engajadas com arranjos que passeiam pelo indie,

Uma viagem no tempo, sem perder tempo. Por Leonardo Cima.

Todos os discos que lançamos pelo selo SoteroRec é especial, com cada um possuindo a sua particularidade. Cada um deles carrega uma história interessante por trás de suas faixas, que as vezes não chega ao ouvinte, mas que fortalecem o fator intangível agregado no resultado final de uma obra. Com toda banda é assim e com a Traumatismo não poderia ser diferente. Foi bem curiosa a maneira como a banda chegou ao nosso acervo. Estava eu conversando com o Adrian Villas Boas, hoje guitarrista da banda Agrestia, sobre a proposta do selo de também promover o resgate da memória da cena local, quando ele me falou que havia essa banda na qual ele fez parte tocando baixo, que chegou a gravar um disco não lançado e que se encaixaria muito bem com o propósito colocado, indicando-a para o catálogo, caso a gente  tivesse interesse nela. Eu, que já fiquei entusiasmado antes mesmo dele citar o nome do grupo, ao saber de qual banda se tratava, fiquei mais empolgado ainda. A Traumatismo, anteriormente cham

O garage noir da The Futchers. Por Leonardo Cima.

Nesses últimos dois meses, o selo SoteroRec teve a honra e a felicidade de lançar na sua série Retro Rocks, os trabalhos de uma das bandas mais interessantes que a cena local já teve e que, infelizmente, não teve uma projeção devidamente extensa. Capitaneada por Rodrigo "Sputter" Chagas (vocal da The Honkers), a The Futchers foi a sua banda paralela idealizada e montada por ele próprio no final do ano de 2006. A propósito, o nome Futchers vem inspirado da dislexia do compositor britânico Billy Childish, que escreve as palavras da mesma maneira que as fala. Ele, ao lado de mais quatro integrantes, também de bandas locais da época, começaram os ensaios com uma proposta sonora voltada mais para o mood e o garage rock, se distanciando um pouco dos seus respectivos trabalhos nos grupos anteriores. Relembrando um pouco daquele período e como observador, esse "peso" de não ter que se repetir musicalmente recaía um pouco mais sobre Rodrigo. Não que houvesse isso